A Cooperativa Languiru anunciou que vai encerrar até 12 de julho os abates no frigorífico de suínos, em Poço das Antas. A medida é consequência da crise que atingiu uma das principais organizações econômicas do município de Teutônia (RS), que tem pouco mais de 34 mil habitantes, segundo o censo de 2021. O prejuízo acumulado chega a R$ 1 bilhão e começa a afetar a vida econômica dos municípios do Vale do Taquari.
O anúncio preocupa as prefeituras vizinhas de Teutônia, cidade-sede da cooperativa que pretende reduzir as atividades na região por conta dos prejuízos. Porém,a Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat), estima que a Languiru representa 15% da geração de ICMS nos municípios do Vale. Diante desse fato, no dia 1º de junho, os prefeitos da região decidiram criar um decreto conjunto de emergência econômica por impactos da crise. De acordo com a Associação, a região sofrerá uma perda direta de R$ 40 milhões em retorno de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Em contrapartida, a cooperativa busca saída para a crise. No dia 29 de maio, o presidente da Languiru, Paulo Roberto Birck, e a comitiva apresentaram plano de reorganização ao secretário-chefe da Casa Civil, do governo gaúcho, Artur Lemos.
Além das centenas de demissões, a preocupação geral com a crise na Languiru também atinge os produtores associados. Mais de 50 mil pessoas têm seu sustento ligado à Cooperativa, direta ou indiretamente. Ao pedir ajuda ao governo do Estado, Brick ressaltou o papel da cooperativa no desenvolvimento local:
“A Languiru teve uma movimentação de recursos na soma de R$ 2,7 bilhões em 2022, gerando R$ 221 milhões em impostos e R$ 261 milhões em valor adicionado aos municípios. No curtíssimo prazo necessitamos de aporte financeiro para manutenção das atividades. Mantida a atual realidade de extrema dificuldade, teremos a parada gradativa das operações. Estamos buscando todo suporte técnico e político na reorganização da Cooperativa. Para isso, o apoio do Estado é fundamental”, disse.
Entenda a crise da Cooperativa Languiru
O anúncio do fim das atividades de abate de suínos é apenas uma das medidas adotadas a partir da destituição do conselho administrativo da cooperativa. Outros cortes também ameaçam os produtores do setor de leite e o de aves.
Para entender a situação, que culminou com a renúncia do presidente Dirceu Bayer, e todo o Conselho Administrativo em 17 de abril, é preciso ver o passado recente da cooperativa, marcado por centenas de demissões, falta de pagamentos, dívidas com instituições financeiras e vendas em baixa.
. A começar pelas dificuldades com a concorrência. Ao contrário das grandes cooperativas, os produtores menores encontram dificuldades para comercialização dos produtos do setor. Tanto no mercado interno quanto no mercado externo.
De acordo com a Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), os problemas com o comércio de carnes e derivados no Estado se agravaram em 2020. E não atingiram apenas a Languiru. A entidade aponta como as causas principais o aumento dos custos de produção, elevação dos preços dos insumos, como ração, energia elétrica e mão de obra, o que impacta negativamente a rentabilidade das empresas.
Outro fator apontado pela entidade é a falta de competitividade do mercado brasileiro, o que se constitui em um desafio enfrentado pelos produtores de carne. A concorrência com países como Estados Unidos, Argentina e Uruguai, que possuem custos de produção mais baixos e condições comerciais favoráveis, torna difícil para as empresas gaúchas competirem internacionalmente.
Os analistas também não descartam os efeitos da instabilidade econômica e política do país. A flutuação cambial, as incertezas em relação à política de exportação e as mudanças nas normas regulatórias impactam o setor, gerando insegurança e dificuldade para planejar investimentos e estratégias de longo prazo.
A Federasul também menciona a pandemia da COVID-19, sobretudo como um elemento que agravou a crise no comércio de carnes. A redução da demanda interna e as restrições nas exportações devido às medidas sanitárias afetaram significativamente as empresas do setor.
Novo Conselho assume
Mas a história não pára. A renúncia do conselho da Cooperativa Languiru provocou a realização de uma Assembleia Geral Extraordinária. Em 29 de abril, Assim, Paulo Roberto Birck foi eleito para a presidência da cooperativa. Até a Assembleia Geral em 2024, caberá a ele e ao novo conselho reverter a situação na cooperativa.
Birck tem 43 anos e é produtor de leite. Tornou-se associado da Languiru em 2013. É formado técnico em Meio Ambiente e tecnólogo em Agricultura Familiar e Sustentabilidade. Um acidente com máquina agrícola teve sérias consequências para ele. Apesar disso, mesmo em cadeira de rodas, assumiu a responsabilidade resgatar os bons tempos da cooperativa que completou 67 anos de atividades.
“A Languiru possui uma história bonita. Mas hoje nos encontramos num momento de dificuldades. Por outro lado, essa situação despertou um sentimento de mobilização e organização, culminando com a eleição do novo Conselho de Administração. A partir disso, o nosso trabalho estará focado na profissionalização, sem a figura do ‘superpresidente’. Essa é uma demanda que vem do quadro social, estando os Conselhos mais próximos da base, conduzindo o planejamento e acompanhando os passos da Languiru”, Disse o novo presidente, de acordo com relato publicado na página da cooperativa.
Cooperativismo na contramão
Mas diante da tentativa de revitalização da cooperativa Languiru, um detalhe chama a atenção. A Assembleia Geral Extraordinária, com 500 integrantes, revogou do estatuto o item que diz que a qualificação em gestão e cooperativismo deveria ser pré-requisito para composição de CoAselhos.
A Cooperativa Agrícola Mista Languiru Ltda foi fundada por 174 produtores. O ano era 1955. Desde então, o grupo cresceu consideralvelmente. entre os anos 60 e 70, a cooperativa incorporou e adquiriu novas empresas. Passou pela terceirização da industrialização do leite. Entre 2019 e 2020, a cooperativa adotou as práticas de governança e um novo modelo de administração. Mas a medida não evitou a crise atual.
Diante de uma crise, por mais que fatores externos sejam a causa, gestores qualificados e especializados podem promover uma vida equilibrada da cooperativa, apesar de exemplos contrários. Nunca é bom prescindir da qualificação da gestão administrativa.