As consequências da presença e da disseminação do novo coronavírus são de várias naturezas, e a mais extrema, para sempre sentida, é a dor pela perda de muitas vidas humanas ao redor do mundo.
Além de chorar as ausências, e também por isso, passaremos por um longo e agudo sofrimento psíquico, resultado do isolamento entre nós, da restrição de locomoção, da contenção de atividades profissionais, do medo, da ansiedade, da aflição, das narrativas desencontradas, do estresse pós-traumático e de outros aspectos envolvidos nesse drama sem paralelo em nossa geração.
Outros dois impactos do flagelo, como causa e efeito, são de ordem econômica e social, dado que a economia entrou em colapso e, por decorrência, empregos e renda se perderam e não poderão ser compensados nos mesmos níveis pelos governos. Os que já eram vulneráveis, por sua vez, ficaram ainda mais desprovidos.
Daí que a solidariedade, tanto para trazer conforto espiritual, como para reduzir limitações de ordem material, passa a assumir uma importância superlativa. Com ela, reduzimos as distâncias e as carências nas duas dimensões.
É hora, portanto, de os agentes econômicos – em fidelidade aos mandamentos de um capitalismo consciente – e as pessoas estenderem as mãos, mesmo que não presencialmente, cada qual segundo as suas características e de acordo com as suas possibilidades, para que todos tenham a condição, ainda que mínima, de fazer a travessia.
No âmbito do cooperativismo, cujo “porquê” repousa sobre valores universalmente aplicados (entre eles, em destaque, justamente a solidariedade), o apoio aos não autossuficientes, seja qual for a causa e a extensão da adversidade, sempre foi seu principal compromisso e o seu cotidiano, razão pela qual o momento não lhe impôs acionar emergencialmente e pontualmente o modo humanitário ou de chamamento à consciência.
As cooperativas financeiras, em particular, desde o princípio da crise honraram o seu propósito, acolhendo e abraçando a sua gente e o seu entorno, provendo soluções voltadas ao enfrentamento da doença, à resiliência econômica e à mitigação de privações básicas. Entre as muitas ações que se seguiram às primeiras providências voltadas à preservação da saúde e da vida dos colaboradores, cooperados e fornecedores, estão:
1) a prorrogação das parcelas presentes dos créditos concedidos aos cooperados vitimados, sem lhes impingir aumento na taxa de juros, cobrar-lhes tarifas ou lhes exigir novas garantias;
2) a renovação automática de limites e a prestação de assistência creditícia aos mesmos públicos, com taxas realmente favorecidas e prazos condizentes com a realidade;
3) o alongamento da carência e dos vencimentos finais de várias linhas de crédito, combinado com a diminuição das taxas de juros;
4) a aplicação de redutor nas taxas de administração dos consórcios, que já eram as mais vantajosas do mercado, e elevação de margens para compras com cartões de crédito;
5) a redução ou mesmo eliminação total de tarifas e preços, inclusive pela aplicação do mecanismo de “cashback”, para um conjunto de operações e serviços, notadamente envolvendo movimentação de conta-corrente, cobrança bancária, adquirência/maquininhas de cartões (suspensão do aluguel dos equipamentos, por exemplo) e cartões;
6) o pagamento integral de todos os benefícios por morte ou invalidez permanente por Covid-19, inclusive para contratos em que haja exclusão explícita de pandemias;
7) a doação de recursos a instituições de saúde, em inúmeras comunidades, com vistas ao combate da Covid-19 (destinados, prioritariamente, à ampliação de leitos e aquisição de produtos, EPIs e novos kits de testes);
8) a prospecção e a execução de projetos de caráter assistencial/filantrópico visando a amparar as pessoas mais desguarnecidas nas respectivas bases de atuação, por meio da valorização de recursos e ativos locais;
9) a implantação, no âmbito do Sicoob, de programa com abrangência nacional designado “Período Apoiador”, voltado à orientação e ao estímulo para as equipes das cooperativas dedicarem uma atenção especialmente humanizada aos cooperados e às suas comunidades, sobretudo por meio (i) da abordagem consciente, acolhedora e altruísta; (ii) da oferta de soluções adequadas às necessidades e sob condições operacionais compatíveis com o momento; (iii) de medidas de cidadania, com ênfase à proteção e inclusão sociais.
Enfim, em um contexto de tantas incertezas e muitas promessas inautênticas, uma certeza e uma verdade: o cooperativismo financeiro, fiel ao seu ideário, segue dando o exemplo!
Ênio Meinen é membro do conselho deliberativo do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB) e diretor de operações do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob). Autor do livro Cooperativismo Financeiro: virtudes e oportunidades. Ensaios sobre a perenidade do empreendimento cooperativo, livro este também versionado no idioma inglês sob o título Financial cooperativism: virtues and opportunities. Essays on the endurance of cooperative entreprise (todos da editora Confebras, lançados em 2014, 2016 e 2018, respectivamente).