Como somar a exponencialidade das plataformas, os princípios cooperativistas e descentralização natural das redes digitais
Quando a transformação digital começou a engrenar no início da década, o otimismo tomou conta dos entusiastas da inovação. Esperava-se que a exponencialidade das tecnologias digitais, que barateiam custos e facilitam o acesso a produtos e serviços, geraria naturalmente uma abundância generalizada.
O prefácio do livro Abundância, do fundador da Singularity University, Peter H. Diamandis, reflete isso. “Imagine um mundo de nove bilhões de pessoas com água potável, alimentos nutritivos, moradia acessível, educação personalizada, atendimento médico de primeira linha e energia onipresente e não poluente. Construir este mundo melhor é o maior desafio da humanidade. O que se segue é a história de como podemos nos erguer para enfrentá-lo”.
Esse prefácio foi escrito em 2012, quando as grandes plataformas digitais ainda não tinham mostrado seu efeito devastador sobre as condições de trabalho. Mas em vez da abundância, veio a chamada “uberização do trabalho”.
Anos depois, o próprio Diamandis passou a ter uma abordagem diferente dos impactos da exponencialidade. O indício está no prefácio de outro livro seu, lançado em 2015. “Passamos a sentir que pintar um quadro vibrante de nosso futuro não basta. Embora acreditemos que criar um mundo de abundância é possível, isso não está em absoluto garantido”. A solução, para Diamandis, é um empreendedorismo visionário, focado em solucionar os grandes problemas mundiais. Concordo, mas isso não basta. Precisamos migrar da lógica da exploração para a da cooperação.
As plataformas digitais, especialmente as de “bicos” (transporte, delivery, reparos etc), têm um problema de origem. Para ter a escala necessária – um ingrediente sem o qual nenhuma plataforma prospera – ela precisa ter custos muito, muito baixos. E geralmente isso é feito às custas dos elos mais fracos da cadeia: o trabalhador, o fornecedor etc. Ou seja, em vez de abundância, elas promovem a exploração – e em ritmo exponencial.
Além disso, a lógica dessas plataformas é contra a vocação naturalmente descentralizada de uma rede digital. Essas plataformas centralizam os dados em um único dono, dão poderes ditatoriais a elas próprias – que podem desligar prestadores de serviços em um clique, sem prévio aviso – e centralizam o poder de decisão – e os lucros. Como resolver isso?
No Coonecta, empresa da qual sou co-fundador para ajudar a criar e desenvolver um vibrante ecossistema de inovação cooperativista, acreditamos que a resposta para essa demanda já existe, e só precisa ganhar corpo. É o cooperativismo de plataforma, que soma os princípios cooperativistas ao formato de negócio de plataforma. Isso garante melhores condições de trabalho, uma descentralização do poder de decisão, maior transparência dos dados e, o mais importante: faz das plataformas geradoras de riqueza e bem estar. Hoje já existem 350 cooperativas de plataforma no mundo todo mapeadas pelo Consórcio para Cooperativismo de Plataforma, liderado pelo professor da The New School of New York, Trebor Scholz. (Mais informações: https://platform.coop). Todos que atuam no cooperativismo sabem de seu poder transformador e de tudo que ele já fez pelo bem estar social. Arrisco dizer, no entanto, que seu impacto nesses quase dois séculos de cooperativismo moderno foram apenas um ensaio do que ele pode fazer nos próximos anos em um formato de plataforma. O momento pelo qual o cooperativismo sempre esperou já chegou!